Quatro nomes da Segunda Geração do Romantismo no Brasil: Junqueira Freire

Edvard Munch.


Junqueira Freire é baiano. Nasceu em 1832 e foi, conforme lembra Antonio Candido, dos de sua geração, "o mais ligado aos padrões do Neoclassicismo"; isso terá se dado por motivo diverso. "Considere-se em primeiro lugar o meio baiano, caracterizado por certa tradição clássica, o amor aos estudos linguísticos, a preferência pela oratória. Ao contrário do que aconteceu noutros lugares não houve
movimento romântico no Salvador: Castro Alves encontrou ambiente estimulante em Recife e São Paulo, não na terra natal. O próprio Junqueira Freire é autor dum compêndio conservador, Elementos de retórica nacional. Explica, também, a desconfiança ante a melodia e o movimento, prezados no Romantismo, sendo interessante notar o modo reversível por que aborda a oratória e a poesia, irmanando-as de certo modo, segundo a tradição dos clássicos. Embora admirador de João de Lemos, era-o sobretudo de Gonçalves Dias, Garrett e Herculano, românticos ainda presos a certos aspectos da estética neoclássica; e, tanto, quanto eles, de Garção e Filinto Elísio, cuja estreiteza formal adotou em grande parte, opondo-se à 'cadência bocagiana'".

Escreveu, além do compêndio mencionado por Antonio Candido dois livros de poesia: Inspirações do claustro e Contradições poéticas, os dois publicados no ano de sua morte (1855). Duas obras marcadas por um sentimento fundo e sincero, para usar as palavras de Manuel Bandeira, porque nascido não da imaginação ou de leituras, mas de sofrimentos reais. "Junqueira Freire era de uma constituição doentia muito peculiar." Sua poesia é assinalada pela contradição, pelo claustrofóbico. Uma compreensão sobre essa relação vida-obra marca-se, no caso da contradição, por exemplo, nos dois rumos em sua vida aparece dividida: primeiro entregue ao prazer barato, depois, dedicado exclusiva à causa religiosa, como se num interesse de encontrar em algum lugar (era um inquieto) a paz terrena; claro, que no novo ofício padeceu mais decepções que paz. Quando largou o claustro (ficou três anos) saiu doente e morreu sete meses depois.

Para Antonio Candido, situado antes de um Guerra Junqueiro e um Antero de Quental (nomes da literatura de sua estima), o poeta brasileiro é o caso de antecipação de um Augusto dos Anjos e da poesia realista da morte; os textos estão marcados pelas referências "à vida embrionária, às vísceras, à célula, bem como o emprego de termos de sabor científico: galvanizar, fosfórico, fosforescente".

"Havia nele mais dum traço original; é lamentável que a pressão insuportável das condições de vida e um formalismo constrangedor houvessem impedido a sua realização plena, no nível de poucos, mas intensos momentos de beleza que logrou alcançar", conclui Antonio Candido.

MORTE
(fragmento)

Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és o termo
De dois fantasmas que a existência formam,
 Dessa alma vã e desse corpo enfermo.

Pensamento gentil de paz eterna,
Amiga morte, vem. Tu és o nada,
Tu és a ausência das moções da vida,
Do prazer que nos custa a dor passada.

Promessa de descanso eterno, refúgio para as dores da vida, a morte aparece também nos poemas de Junqueira Freire. Não diferente dos demais da sua geração. Também nele há o amor não-correspondido, fonte de sofrimento insuportável. O binômio amor-morte será traduzido muitas vezes pela oposição entre o desejo de amar e o desejo de morrer, consequência talvez da decisão tomada ainda na juventude de se tornar monge beneditino, posição que afastando-o dos prazeres terrenais o propiciou entrar em contato e conviver com os livros e a escrita da sua obra.

Em 1853, Junqueira Freire pede o direito à secularização e consegue libertar-se da disciplina monástica depois de estabelecer votos perpétuos para o sacerdócio. É dessa época sua dedicação ao trabalho de organizar e cuidar da impressão de uma das duas coletâneas de versos hoje conhecidas: a intitulada Inspirações do claustro foi impressa pouco antes da sua morte, também muito jovem: contava 23 anos.

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